quinta-feira, 31 de janeiro de 2013



Bicicletas nas guerras

Versáteis, as bicicletas são utilizadas pelos exércitos desde o final do século 19. Unidades de ciclistas fizeram história em conflitos do passado e, até hoje, soldados em duas rodas enfrentam guerras mundo afora

Por Marcos Adami – Bikemagazine
As bicicletas são utilizadas nas guerras desde o final do século 19. Os exércitos das nações europeias e dos Estados Unidos as adotaram como uma alternativa viável e econômica no deslocamento dos soldados de infantaria. Um novo modelo de bicicleta criado pelo engenheiro britânico Henery J. Lawson, em 1876, com duas rodas do mesmo tamanho e tração traseira, substituiu rapidamente as primitivas bikes do tipo “Shake Bones”, com tração na gigantesca roda dianteira. O invento de Lawson, aos poucos, foi ganhando importância nas fileiras dos exércitos e até mesmo substituindo os cavalos em algumas missões.
Assim, antes da virada do século 19, o exército da França e dos Estados Unidos já dispunham – ainda que em caráter experimental – de unidades formadas por soldados ciclistas e, em 1880 os britânicos contavam com várias unidades de ciclistas voluntários. Na Suíça, o regimento “Velocorps” foi criado em 1905 e virou referência mundial quando o assunto é bicicleta militar.
A primeira notícia que se tem da utilização da bicicleta como veículo militar foi durante a guerra de independência da África do Sul, em 1896, na época uma colônia britânica.
MIL E UMA UTILIDADES
Bastante eficiente nos deslocamento em curtas e médias distâncias, a bicicleta se mostrou adequada em algumas tarefas, como patrulhamento e reconhecimento, e no transporte de mensageiros com a vantagem de não sobrecarregar os serviços de logística, pois bicicleta não bebe água, não se alimenta, não fica doente, não consome combustível e tem baixíssima manutenção. De bike, um soldado pode cobrir num dia mais de 120 km, o triplo de um soldado a pé. Para os paraquedistas, a bicicleta é um meio versátil de transporte que se encaixa na lacuna entre o soldado de infantaria e outros meios de transportes motorizados mais pesados. A bike, que não precisa de apoio logístico adicional, pode ser facilmente armazenada num cantinho de um caminhão, jipe ou helicóptero, além de permitir ser  aerotransportada e lançada  diretamente no local de combate.
Com todas essas qualidades, não é em vão que as bicicletas estiveram presentes em praticamente todos os conflitos importantes da história desde quando foi inventada. Elas foram à luta na I e na II Guerra Mundial, na Guerra da Coréia, na revolução chinesa, na Guerra do Vietnã e ainda são vistas no front do Iraque, no Sri Lanka e no Afeganistão. Nas grandes cidades, muitas forças policiais utilizam a bicicleta como uma poderosa ferramenta de patrulhamento.
BUFALO SOLDIERS
Em 1896, o tenente James A. Boss liderou um grupo formado por 20 soldados, um médico e um repórter que pedalou do Forte Missoula, no estado de Montana, até Saint Louis, no Missouri, por trilhas que seguiam basicamente paralelas aos trilhos da ferrovia Northern Pacific. A jornada de 41 dias e 3 mil quilômetros cruzou cinco estados e serviu como um teste para avaliar a viabilidade do uso militar da bicicleta no exército americano. Os soldados liderados por tenente Boss eram negros e ficaram conhecidos como “Bufalo Soldiers” da 25º Batalhão de Infantaria Ciclística. O feito ganhou as páginas dos jornais de Missoula e dos Estados Unidos e, conta-se, sua chegada em Saint Louis foi saudada por um público de 10 mil pessoas. Um ano após a viagem, os Bufalo Soldiers provaram seu valor como guerreiros e asseguraram vitórias importantes na guerra contra os espanhóis.
OUTROS CONFLITOS
A primeira notícia do uso da bicicleta em combate foi com os britânicos e suas bicicletas dobráveis Dursley-Pedersen, na Guerra dos Boeres, na África do Sul, em 1899. As bikes Dursley-Pedersen eram fabricadas na Inglaterra, na cidade de Dursley, em Gloucestershire, pelo engenheiro e inventor dinamarquês Mikael Pedersen, e tinham um design bastante esquisito, mesmo para a época.
Na primeira guerra mundial, as bicicletas tiveram papel importante em todos os conflitos do continente europeu. Holanda, Itália, Dinamarca, Polônia e Rússia mantinham destacamentos especiais de infantaria ciclomontada e a Alemanha chegou a ter 80 companhias de infantaria leve que utilizavam a bicicleta como meio de locomoção.
Em 1937, durante a invasão da China, o Japão empregou 50 mil soldados ciclistas.
Durante a segunda guerra mundial, até a pacífica Finlândia empregou extensivamente as bicicletas da 1ª Brigada Jaeger na luta contra a Alemanha nazista e a Rússia. A Suécia mantinha seis regimentos de cicloinfantaria que duraram até o ano de 1952. As bikes militares suecas modelo m/42 – as militärcykel -  foram produzidas por diversos fabricantes e fizeram tanto sucesso que, em 1997, a marca Kronan produziu algumas bikes a pedido dos fãs.
Os paraquedistas britânicos utilizaram o modelo dobrável da marca BSA (Birmingham Small Arms), famosa pelas suas motocicletas. A BSA Airborne foi utilizada em várias operações nos teatros de guerra da Europa continental, no Mediterrâneo e participou do desembarque na Normandia no Dia D.
ARMA DO POVO
Por ser uma opção econômica e popular de transporte, as bicicletas desempenharam papel importante em diversos cenários de conflitos. No final da década de 60, as bicicletas foram largamente empregadas na Guerra do Vietnã (1959-1975) e tiveram papel fundamental no abastecimento das tropas do exército norte-vietnamita pela lendária e montanhosa trilha Ho Chi Minh. Com quadros reforçados em oficinas de fundo de quintal e carregadas com até 180 kg de víveres, armas e munições, as bicicletas eram praticamente os únicos veículos que faziam o transporte de suprimento entre o Vietnã do Sul e do Norte pelo improvisado caminho que avançava pela selva dos países vizinhos Camboja e Laos. Naquelas condições, a “Arma do Povo”, como eram chamadas as bicicletas, eram impossíveis de serem pedaladas e eram empurradas no ritmo de pedestre. Em outros conflitos mundo afora, as bicicletas também foram o meio de locomoção usado por muitas levas de refugiados que optaram pela bicicleta como a única forma de escapar da zona de guerra.
MONTAGUE PARATROOPER
Mesmo com toda a tecnologia atual, que vai de mísseis a aviões não tripulados, a bicicleta ainda tem seu papel nas guerras modernas.
Desde 1997 a empresa americana Montague Corporation fornece bicicletas para as forças armadas dos Estados Unidos. O lema do fabricante é “The First to Hit The Ground”, ou seja, a primeira que chega no chão. O modelo Paratrooper dobrável foi desenvolvido para ser aerotransportado. A bike é empregada por várias forças dos EUA em vários conflitos, inclusive no Iraque.
A Montague Paratrooper tem aro 26” e o sistema dobrável foi desenvolvido em parceria com o exército para ser montada em menos de 30 segundos. Quando dobrada, a bike mede apenas 90 x 70 x 30 cm e o peso é de 13,5 kg. O quadro é de alumínio 7005 pintado na cor verde oliva. Tem suspensão, freio a disco e vem com grupo Sram de 24 marchas. A bike é comercializada também no mercado civil com preços que variam de 700 a 2.500 dólares, dependendo da configuração.
CONDOR FAHRRAD 93
Na Suíça, as bicicletas tinham lugar de destaque entre os militares desde 1905 com os “Schweizer Militärradfahrer”, os batalhões ciclísticos do exército.  No país de relevo acidentado e coberto por florestas, a mountain bike foi empregada até 2003 como veículo de deslocamento rápido por várias brigadas.
A robusta Condor Fahrrad 93 foi o último modelo utilizado pelo exército suíço. O quadro é feito de aço e pesa 21,5 kg. Vem com bagageiro dianteiro e traseiro e pode transportar até 60 kg de carga, incluindo arma antitanque. Os freios são Magura hidráulicos e atuam diretamente sobre o aro. O câmbio traseiro Shimano XT tem sete velocidades e o cubo dianteiro tem um dínamo embutido. Atrás do tubo vertical há uma enorme caixa de ferramentas e uma bolsa entre os tubos do quadro serve para transportar roupas. Opcionalmente, a bike pode rebocar um trailer.
BIKES DA PAZ
Há cerca de três anos, a versatilidade das bicicletas foi aplicada também nas missões de paz da ONU e já servem de meio de transporte para os soldados do 32º Regimento do Exército Territorial Britânico, unidade subordinada ao exército regular britânico formado por civis e voluntários. Esses soldados da paz utilizam mountain bikes no patrulhamento das zonas desmilitarizadas controladas pelas ONU Unidas em Chipre.
A operação em Chipre é a mais longa na história dos soldados da paz, que zelam pela segurança na ilha e mantém em paz os gregos cipriotas no sul e os turcos no norte. Os soldados são comandados pelo major Andrew Thompson, que em sua vida civil é responsável pela bike shop Mountain Bike Trax, na cidade escocesa de Aberdeen.
“Bikes são ideais para patrulhas. Elas são silenciosas e causam menos provocação, diferente de soldados que usam veículos militares. Com elas captamos mais detalhes de situações do que quando estamos no interior de veículos e ao mesmo tempo cobrimos uma área maior do que quando estamos a pé”, explicou o major Thompson.
TABELA DE COMPARAÇÃO DE EFICIÊNCIA

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