quarta-feira, 24 de abril de 2013


POLICIA DE BICICLETA
















Os turistas gostam de tirar fotografias e, quando sobem a Avenida do Infante, não há quem se atreva a fazer ultrapassagens. Os quatro agentes das ciclo-patrulhas do Funchal em Portugal contam como é ser polícia de calções, capacete e bicicleta.

As rotinas das patrulhas, de acudir a desordens e a chamadas para casos de violência doméstica mudaram quando René Sousa, de 34 anos, fez o curso e foi aprovado como agente das bicicletas, das ciclopatrulhas da Polícia de Segurança Pública _ PSP. Trocou a farda por calções e um capacete e, quase sem dar por isso, transformou-se numa atração turística. "Há fotografias nossas espalhadas pelo Mundo", diz o homem que está há 12 anos na polícia. Habituado a outro ritmo, garante que os turnos entre a baixa do Funchal, a zona balnear e o teleférico do Monte são calmos. "Tirando as quedas, a curiosidade da população e dos turistas".
René sabe do que fala e a ciclopatrulha pode ser mais calma, virada para a prevenção e para o Verão seguro, mas exige do corpo e ninguém está livre de escorregar e cair. O agente atribui o azar a um defeito de fabrica da bicicleta, mas claro que a versão dos outros três membros das ciclopatrulhas não é bem a mesma. "Tropeçou num degrau de 14 centímetros", ironiza Nuno Rodrigues, 32 anos, o agente com quem divide os turnos. Bem-disposto, faz o papel de polícia simpático, gosta de piadas e lembra-se que, nos primeiros tempos, toda a gente os comparava aos 'Asas nos Pés', a série que na altura passava no AXN.
A série saiu de emissão e, agora, o espanto é dos turistas que, quando os apanham parados na Avenida Arriaga, não resistem a tirar fotografias. Os mais tímidos tiram ao longe, os mais atrevidos pedem para posar ao lado dos polícias. Os calções dão um ar descontraído, quase parece que não são polícias, mas a verdade é que são, podem fazer recomendações e passar multas como qualquer outro agente. "Às vezes, quando abordamos as pessoas, os condutores por exemplo, ficam a olhar espantados, falta pouco para dizerem quem é este pequeno de bicicleta". Se, por acaso, o assunto obriga a passar a tal multa, a surpresa é ainda maior.
Décio Pinto, que esteve antes no Trânsito, sente esse espanto, essa mudança de comportamento porque, na PSP, a farda faz mesmo a diferença. Os condutores ficam surpreendidos, duvidam da autoridade daqueles rapazes de capacete e bicicleta. Mas lá por ser diferente não quer dizer que não seja compensador e Décio, 30 anos de idade e seis de polícia, até brinca: o Estado paga o salário e garante exercício físico. Andar de um lado para outro na baixa e na promenade não é coisa tão simples e tão ligeira. De fato, cansa e há até quem diga que as ciclopatrulhas empatam o trânsito, sobretudo quando, em horas de maior movimento, um dos agentes decide subir a Avenida do Infante.
"Só atrapalha a quem não sabe conduzir". Paulo Pimenta, 31anos, é a consciência crítica destas patrulhas. O polícia "mau" que, feito um aviso, não deixa passar segunda infração. Os miúdos dos skates - os que ficaram sem a pista na Avenida do Mar e insistem em praticar  que o digam. Regras são regras e, no que se refere a bicicletas e skates, os únicos autorizados pelo regulamento municipal do Funchal a circular em cima dos passeios são os polícias. "Todos os outros devem circular junto ao meio fio da rua e estrada", explica o agente que também não percebe tantos cuidados em fazer ultrapassagens. "Só quando mandamos avançar é que se decidem". E, nisso, as mais receosas são as mulheres que, segundo os agentes, quase mudam de faixa para eles passarem.
Embora integrados no projeto de policiamento de proximidade, as histórias dos homens das bicicletas não acabam nas fotografias dos turistas, nem nas multas aos rapazes dos skates ou nas comparações com as séries de televisão. Quando é a valer correm como qualquer polícia para acudir a assaltos, desavenças e acidentes. Na Marina do Funchal, ainda há pouco tempo, foram eles os primeiros a chegar para ajudar um camarada de Câmara de Lobos que, em dia de folga, socorria a um idoso vítima de assalto. E o mesmo fizeram num acidente na Rua do Carmo onde chegaram primeiro que as ambulâncias, que os bombeiros e que a EMIR. A meio do trânsito, uma bicicleta circula mais depressa do que um carro patrulha, do que uma ambulância.
Os quatro agentes estão prontos para ir para o terreno, ouvem as indicações de Luís Telo, o supervisor das ciclopatrulhas da Esquadra do Funchal. Uma equipe segue para a Avenida do Mar, para a zona do Teleférico. A PSP tem um protocolo com a empresa que gere os teleféricos e, ao abrigo desse acordo, os polícias patrulham o teleférico e a zona do Monte. A outra equipa vai para a promenade do Lido e, ambas, vão fazer aquilo que fazem todos os dias: prevenção. "A presença de um polícia fardado tem sempre um efeito dissuasor", explica o supervisor das equipas. A verdade é que, na Praia Formosa, o número de furtos aos veraneantes caiu e já se pensa em estender o programa pelo Inverno. Para já, e ainda em período experimental, criou-se um turno das sete da noite à uma da manhã.
A temperatura e as férias trazem mais pessoas para a rua à noite e, à cautela, a PSP decidiu alargar o policiamento das bicicletas até mais tarde. Há muita gente a passear nas promenades, a andar na Estrada Monumental e até na Avenida do Mar. E, por ser uma terreno de turismo e ter um Inverno ameno, as equipes deste ano não vão encostar, nem esperar pela chegada da nova época balnear. Folgas nos patrulhamentos de bicicleta será nos dias de chuva. A aposta é tal que, neste momento, já se pensa em formar novos agentes e existem perspectivas de receber mais bicicletas adaptadas às funções.
O aspecto descontraído faz dos agentes das ciclopatrulhas os rostos da estratégia de relações públicas da PSP. Os tempos do guarda sisudo que só aparecia em caso de zaragata ou para mandar circular passaram. ou melhor, além de fazer isso, pede-se também que contate a população, que ouça as queixas e os medos, que dê o número de telefone e esteja disponível. Os quatros agentes das bicicletas, Luís Telo, o supervisor, e Teixeira Mendes, o sub-comissário que comanda a Esquadra do Funchal, fazem parte dessa nova geração que tem esperança no projeto integrado de policiamento de integrado.
Na Esquadra do Funchal, esse projeto de proximidade tem, além das bicicletas, a 'Escola Segura', 'Idosos em Segurança', policiamento em Santo António e no Bairro da Nazaré, apoio às vítimas de violência doméstica e aos comerciantes da baixa da cidade. Aos poucos, que as melhores mudanças são as que começam devagar, os polícias procuram chegar às pessoas, tentam encaminhar os jovens e desviá-los da delinquência. À porta das escolas, ao toque de saída da manhã e da tarde, passam a ver se há gente estranha e comportamentos suspeitos e, quando andam a pé pelas ruas do Funchal, ouvem as sugestões e as preocupações dos comerciantes.
"Esta é uma nova geração de polícias, com outra formação, que já não está de costas voltadas para os cidadãos, que, quando está no terreno, já não fala apenas com o colega que vai render. Pelo menos essa é a mensagem que passamos aos nossos agentes, que falem, que escutem e contactem com as pessoas". Luís Telo, o sub-chefe que sempre quis ser polícia, acredita que, todos os dias, os seus homens fazem por isso. Os das bicicletas e os outros.

Nenhum comentário:

Postar um comentário